Vozes-Mulheres(Conceição Evaristo)
A voz de minha bisavó
ecoou criança
nos porões do navio.
Ecoou lamentos
de uma infância perdida.
A voz de minha avó
ecoou obediência
aos brancos-donos de tudo.
A voz de minha mãe
ecoou baixinho
revolta
no fundo das cozinhas alheias
debaixo das trouxas
roupagens sujas
dos brancos
pelo caminho empoeirado
rumo à favela.
A minha voz
a minha voz ainda
ecoa versos perplexos
com rimas de sangue e fome.
A voz de minha filha
recolhe todas as nossas vozes
recolhe em si
as vozes mudas
caladas
engasgadas nas gargantas.
A voz de minha filha
recolhe em si
a fala e o ato.
O ontem, o hoje, o agora.
Na voz de minha filha
se fará ouvir
a ressonância
o eco da vida-liberdade.
—
Potência e beleza da história de resistência negra.